Antes, porém, de iniciarmos a abordagem mais
específica do pensamento político de Locke, bom frisar, que ele escreveu dois Tratados,
que ficaram conhecidos mais tarde como Primeiro Tratado e Segundo Tratado sobre
o Governo, e que se tornaram suas obras de maior repercussão. O Primeiro
Tratado, escrito provavelmente no início dos anos 1680, consiste numa refutação
das ideias contidas no livro “O Patriarca”, do pastor anglicano Robert Filmer,
na qual há a defesa do direito divino dos reis com base no princípio de
autoridade paterna de Adão, considerado o primeiro monarca, a quem Deus
agraciara com o poder real que legará a seus descendentes a referida
autoridade. E Locke critica essa tradição que afirmava o direito divino dos
reis, declarando que a vida política é uma invenção humana, completamente
independente das questões divinas.
Já no Segundo
Tratado sobre o Governo Civil, expõe sua teoria do Estado liberal e a
propriedade privada.
O período
em que Locke viveu e escreveu foi profundamente marcado por lutas internas e
disputas de poder entre atores sociais de peso que desembocaram numa sangrenta
guerra civil, a qual levaria à decapitação do rei Carlos I, em 1649, e só teria
fim com a Revolução
Gloriosa, em 1688, e a ascensão da casa de Orange ao trono inglês. Assim,
especificamente no Segundo Tratado
sobre o Governo Civil, que será especificadamente objeto do presente trabalho, John
Locke orienta sua argumentação com, pelo menos, dois objetivos práticos de
relevo em mente: 1) mostrar o bom fundamento da condição do novo rei, Guilherme
de Orange. Isto é, mostrar que o rei governa com o consentimento do povo, único
fator que pode legitimar um governo; 2) mostrar que a derrubada de um governo
deve ser justificada: não se modifica uma ordem legal sem razões fortes.
De acordo
com Weffort, Locke, em seu Segundo Tratado, advoga que não é a tradição nem a
força que constituem a fonte legítima do poder político, e sim, de modo
exclusivo, o consentimento pleno dos governados. A concepção de Estado de Locke
é, segundo Bobbio, "a primeira e mais completa formulação do Estado
liberal".²
_______________________
[2] WEFFORT,
Francisco. Os clássicos da política. Editora Ática, São Paulo, 1991.
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