Sociedade Civil


99. (...) Assim, o ponto de partida e a verdadeira constituição de qualquer sociedade política não é nada mais que o consentimento de um número qualquer de homens livres, cuja maioria é capaz de se unir e se incorporar em uma tal sociedade. Esta é a única origem possível de todos os governos legais do mundo.

104. Para concluir, temos a razão do nosso lado quando afirmamos que os homens são naturalmente livres, e os exemplos da história mostram que todos os governos do mundo que tiveram uma origem pacífica foram edificados sobre esta base e devem sua existência ao consentimento do povo. (...).

123. (...) ainda que no estado de natureza ele tenha tantos direitos, o gozo deles é muito precário e constantemente exposto às invasões de outros. Todos são tão reis quanto ele, todos são iguais, mas a maior parte não respeita estritamente, nem a igualdade nem a justiça, o que torna o gozo da propriedade que ele possui neste estado muito perigoso e muito inseguro. Isso faz com que ele deseje abandonar esta condição, que, embora livre, está repleta de medos e perigos contínuos; e não é sem razão que ele solicita e deseja se unir em sociedade com outros, que já estão reunidos ou que planeja m se unir, visando a salvaguarda mútua de suas vidas, liberdades e bens, o que designo pelo nome geral de propriedade.

124. Por isso, o objetivo capital e principal da união dos homens em comunidades sociais e de sua submissão a governos é a preservação de sua propriedade. O estado de natureza é carente de muitas condições. Em primeiro lugar, ele carece de uma lei estabelecida, fixada, conhecida, aceita e reconhecida pelo consentimento geral, para ser o padrão do certo e do errado e também a medida comum para decidir todas as controvérsias entre os homens. Embora a lei da natureza seja clara e inteligível para todas as criaturas racionais, como os homens são tendenciosos em seus interesses, além de ignorantes pela falta de conhecimento deles, não estão aptos a reconhecer o valor de uma lei que eles seriam obrigados a aplicar em seus casos particulares.

125. Em segundo lugar, falta no estado de natureza um juiz conhecido e imparcial, (...).

126. Em terceiro lugar, no estado de natureza freqüentemente falta poder para apoiar e manter a sentença quando ela é justa, assim como para impor sua devida execução. (...).

128. (...) o homem detém dois poderes. O primeiro é fazer o que ele acha conveniente para sua própria preservação e para aquela dos outros dentro dos limites autorizados pela lei da natureza; (...) O outro poder que o homem tem no estado de natureza é o poder de punir os crimes cometidos contra aquela lei. A ambos ele renuncia quando se associa a uma sociedade política privada, se posso chamá-la assim, ou particular, para se incorporar a uma comunidade civil separada do resto da humanidade.

129. O primeiro poder, ou seja, aquele de fazer o que julga conveniente para a sua própria preservação e a do resto da humanidade, ele deixa a cargo da sociedade, para que ela o regulamente através de leis, na medida em que isto se faça necessário para a sua preservação e a do restante daquela sociedade; estas leis da sociedade em muitos pontos restringem a liberdade que ele possuía pela lei da natureza.

130. Ao segundo, o poder de punir, ele renuncia inteiramente e empenha sua força natural (que antes podia empregar como bem entendesse, por sua própria autoridade, para fazer respeitar a lei da natureza) para ajudar o poder executivo da sociedade, conforme a lei deste exigir. (...).

131. (...) requeira, cada um age dessa forma apenas com o objetivo de melhor proteger sua liberdade e sua propriedade (pois não se pode supor que nenhuma criatura racional mude suas condições de vida para ficar pior), e (...)civil, deve governar através de leis estabelecidas e permanentes, promulgadas e conhecidas do povo, e não por meio de decretos improvisados; por (...).

132. (...) elementos, a comunidade pode combinar e misturar formas de governo como melhor lhe parecer. Se a (...).

Observa-se que a passagem do estado de natureza para a sociedade civil se opera, quando, através do contrato social, os indivíduos singulares dão seu consentimento unânime para a entrada no estado civil. Para estudar o estado civil em Locke devemos ter claro que este não o concebe segundo a dicotomia hobbesiana senão por uma tricotomia. Locke, portanto, não identifica, como Hobbes, o estado de natureza com o estado de guerra. No estado de natureza os homens podiam dispor de sua propriedade e atuar dentro dos limites marcados pela lei da natureza. Mas, no estado de natureza havia um inconveniente. Todos podiam aplicar a lei da natureza e nem todos respeitavam o mandato de equidade e justiça. A sociedade civil nasce e constitui-se, para unificar os poderes individuais e estabelecer leis fixas. Em Locke, quando surge o Estado, passa-se da pluralidade dos poderes naturais a unidade do poder político. Assim, sempre que qualquer número de homens se reunirem em uma sociedade de tal sorte que cada um abandone o próprio poder executivo da lei de natureza, passando-o ao público, neste caso, e, somente nele, haverá uma sociedade civil.

O estado civil, segundo Locke, nasce do desejo que os homens têm de conservar os direitos naturais fundamentais, ou seja, a propriedade, a vida, a liberdade. Portanto, quem entra no estado civil não renuncia aos direitos, mas, pelo contrário, quer garanti-los. O estado civil é substancialmente a criação de uma autoridade superior aos simples indivíduos para a proteção dos direitos naturais fundamentais. No estado de natureza, o homem tem os direitos, mas não estão garantidos. No estado civil, o homem não perde os direitos naturais, mas conserva-os, agora, garantidos pelo poder supremo.

A finalidade principal da união política e da submissão a um governo é a conservação das propriedades dos indivíduos: vida, liberdade, posses. Mais especificamente, o estado civil tem a finalidade primordial da preservação da propriedade. Deste modo, sendo os homens todos livres, iguais e independentes, ninguém pode ser expulso de sua propriedade e ser submetido ao poder político de outrem sem dar seu consentimento. Pois, a maneira rica em virtude da qual uma pessoa renuncia a liberdade natural e reveste-se dos laços da sociedade civil consiste em concordar com outras pessoas em juntar-se e unir-se em comunidade, para viver com segurança, conforto e paz umas com as outras, gozando com garantia das propriedades que tiverem e desfrutando de maior proteção contra quem quer que se faça parte dela.

Cada homem nasceu, com efeito, com um duplo direito: o direito a liberdade de sua pessoa, o direito a propriedade de seus bens. Ora, são precisamente esses dois direitos naturais que, para Locke, definem fundamentalmente a natureza humana.

Mas, para ter ainda mais garantidos os seus direitos naturais, o homem, através do contrato social, expresso pelo consentimento, entra na sociedade civil, para superar os perigos do estado de natureza e para garantir seus direitos naturais fundamentais, especialmente, o direito de propriedade.

Podemos perceber uma teoria política da liberdade. Locke objetivou o estabelecimento das condições necessárias a esta liberdade. Foi um apaixonado pela verdadeira liberdade do homem.

O começo da sociedade civil depende do consentimento dos indivíduos em se unir e formar uma sociedade.

Bom mencionar também, que o poder legislativo é o poder supremo. É supremo porque representa literalmente a forma conjunta da comunidade que, para permanecer um corpo, pode ter apenas um poder supremo. Assim, a primeira lei positiva e fundamental de todas as comunidades consiste em estabelecer o poder legislativo. Este, por sua vez, sendo constituído pela sociedade, tem a obrigação e o objetivo de zelar pela paz, segurança e bem comum do povo, provendo contra os inconvenientes que tornam o estado de natureza tão inseguro e arriscado.

O legislativo, pelo poder a ele confiado pela sociedade e pela lei de Deus e da natureza, tem de governar por meio de leis estabelecidas e promulgadas, tendo como fim último o bem do povo. A lei, para Locke, não constitui uma restrição aos direitos dos homens, mas a garantia desses direitos.

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